A cada modificação em seu regulamento a Liga dos Campeões fica mais ao gosto dos grandes da Europa. A próxima edição terá duas novidades feitas sob medida para os mais ricos, e o passo final sonhado por eles é abandonar a Uefa (União Europeia de Associações de Futebol) e fundar a Superliga – uma competição que não teria “intrusos” pequenos e geraria uma fábula de dinheiro em direitos de tevê.
A mudança mais importante para a temporada 2018/2019 diz respeito ao critério de admissão dos participantes. As quatro principais Ligas da Europa (Inglaterra, Espanha, Itália e Alemanha) terão quatro representantes garantidos na fase de grupos, o que preencherá metade das 32 vagas. Com mais vagas asseguradas para os grandões, é lógico que os pequenos terão reduzidas suas chances de chegar a essa fase e ganhar um bom dinheiro – na edição em andamento a participação valeu 12,7 milhões de euros (R$ 50,8 milhões).
No regulamento atual, nenhum país tem quatro times garantidos na fase de grupos da Liga dos Campeões. Inglaterra, Espanha e Alemanha têm três (o quarto joga uma fase preliminar), e a Itália, que será a maior beneficiada, tem dois garantidos e o terceiro na última fase preliminar.
A medida foi aprovada em 2016, quando a Uefa era dirigida pelo espanhol Angel-Maria Villar – que havia assumido o cargo no ano anterior em lugar do francês Michel Platini, afastado por envolvimento em corrupção no escândalo da Fifa. O esloveno Aleksander Ceferin, que assumiu o comando da entidade em setembro de 2016, lamentou a decisão. “É uma decisão ruim para os pequenos, como a minha Eslovênia. Mas não posso fazer nada para mudar isso.”
A associação que congrega 24 Ligas da Europa (Assciação Europeia de Ligas de Futebol Profissional, EPFL na sigla em inglês) também condenou a decisão. “É uma medida inaceitável, que foi tomada sem consenso e sem discussão com as Ligas menores.”
A segunda medida que agrada aos grandes e entrará em vigor na próxima edição estabelece que um jogador que tenha disputado a fase de grupos da Liga dos Campeões por uma equipe poderá ser inscrito por outra para os “mata-matas”. No regulamento em vigor, um jogador não pode participar da mesma competição por dois times – razão pela qual o Barcelona não está podendo utilizar Philippe Coutinho na Liga dos Campeões (ele havia jogado pelo Liverpool). O clube espanhol gastou 160 milhões de euros (R$ 640 milhões) na operação e não pode colocá-lo ao lado de Messi e Suárez no torneio mais importante do continente. É permitido trocar três jogadores na lista de inscritos antes das oitavas de final, mas se alguém jogou na Liga dos Campeões só pode ser inscrito na Liga Europa – e vice-versa. A partir de 2018/2019, não haverá restrições para as trocas.
A Uefa argumenta que essa mudança segue o modelo das Ligas nacionais, que permitem que um jogador jogue por dois times. Foi o que aconteceu em janeiro com o atacante chileno Alexis Sánchez, que trocou o Arsenal pelo Manchester United e pôde ser inscrito na Premier League. Ele também pôde ser escalado na Liga dos Campeões, porque o Arsenal jogou a Liga Europa.
O sonho dos clubes ricos é criar a Superliga, competição com presença fixa das 20 principais agremiações do continente. Não haveria BATE Borisov, Astana ou APOEL, nanicos que na opinião dos grandes não acrescentam nada à Liga dos Campeões.
A mudança seria particularmente boa para os ingleses, porque há pelo menos seis clubes em condições de lutar pelas quatro vagas na principal competição europeia: Manchester City, Manchester United, Liverpool, Chelsea, Arsenal e Tottenham. Dois ficarão fora da próxima edição, mas se houvesse a Superliga todos estariam garantidos.
Com os times mais ricos e de mais torcida presentes à competição todo ano, com vários clássicos em todas as rodadas, os direitos de tevê seriam vendidos por uma fortuna – e o bolo não precisaria ser dividido com os pequenos, como acontece hoje.